Carlos Portilho é formado em Direito e tem pós-graduação na mesma área. Jamais pensou em fazer mestrado, muito menos em Design, até que conheceu o curso da CESAR School e descobriu que “design não se limitava a formas e estilos, mas sim, era algo que tratava de melhorar a vida das pessoas de maneira prática e dinâmica”. Agora mestre, Portilho apresentou uma dissertação voltada à sua área de atuação – “Design de serviços e gamificação para a motivação de servidores públicos: estudo de caso de um programa de melhoria de produtividade e reconhecimento de um órgão do Poder Judiciário”. Ele falou sobre o trabalho. Confira:
Escolha do tema
Sendo operador do Direito há anos, percebi que a área é permeada por um excesso de burocracia que muitas vezes afeta diretamente a eficiência do trabalho e do serviço prestado. Observei que muito se fala na “experiência do usuário” e em como as instituições precisam focar no nele, no cliente, no cidadão, para que se ofereça serviços de melhor qualidade, mas pouco se fala da experiência do funcionário, do servidor. Entendo que para que se preste um bom serviço, tão importante quanto melhorar fatores externos, é preciso cuidar do alinhamento interno das equipes de trabalho. A partir dessa premissa, como servidor do Judiciário, optei por analisar o contexto em que estou inserido e como melhorar os serviços prestados, mas priorizando o lado de dentro para que isso refletisse para o lado de fora.
Como o design de serviços e a gamificação podem ser utilizados no processo de desenvolvimento de políticas de engajamento de equipes de trabalho e motivação de colaboradores
A ideia de usar a gamificação se deu principalmente por conta do programa Muito Além das Metas, implementado pelo TJPE, com o intuito de melhorar os níveis de produtividade e engajamento dos servidores e magistrados. Apesar de claramente se valer de elementos de gamificação, percebi que ele ainda carece de muitos ajustes para que seus objetivos sejam alcançados. Nesse sentido, acredito que tanto o Design de Serviços quanto a gamificação colocam à disposição ferramentas e mecânicas capazes de proporcionar uma visão pragmática sobre os mais diversos processos, tomando as necessidades humanas como ponto de partida para insights e escolhas.
Propostas apresentadas
Apesar de todos os problemas percebidos e trabalhados ao longo da pesquisa, um que chamou bastante a atenção foi o sentimento de desvalorização que muitos servidores têm com relação à instituição. Percebi que isso tem reflexo na maneira como o servidor se comporta. Para buscar uma solução, foquei em alguns pontos sensíveis, mas com grande potencial de mudança cultural: por exemplo, o aperfeiçoamento do sistema de acolhida de novos servidores, que propõe uma abordagem mais humana e integrativa realizada diretamente por servidores que atuariam num programa de acompanhamento ou mentoria.
Mudanças durante a pesquisa
Inicialmente, a proposta era estruturar um framework capaz de auxiliar o tribunal na tomada de decisões relacionadas a ações para o engajamento interno. Mas, ao longo da pesquisa, percebi que não teria condições naquele momento, pois estamos falando de uma instituição com quase 10 mil funcionários com atuação em todo o estado. Assim, em acordo com os orientadores, optei por focar em um programa específico do tribunal que tratava do assunto “engajamento”, principalmente porque, durante a etapa inicial de pesquisa, muitos servidores se queixavam da maneira como o programa estava estruturado e de que não se sentiam motivados a participar.
Como os resultados podem melhorar os serviços para o público final
Assim como a produtividade pode ser indicativo da dedicação e do empenho do funcionário, o bom atendimento e a proatividade podem refletir o ambiente interno das equipes. As propostas elencadas sugerem mudanças internas que afetam diretamente o serviço prestado. O Conselho Nacional de Justiça propôs metas objetivas para a melhoria da produtividade dos tribunais; no nosso trabalho, demonstramos como o ambiente interno impacta diretamente na qualidade dos serviços prestados.
Como ressaltam alguns autores, tanto de gamificação quanto de Design, pessoas felizes se dedicam mais, trabalham com mais afinco, são proativas. Posso sintetizar aqui que os resultados alcançados miram na valorização das pessoas por trás do serviço, tornando-as parceiras na realização do trabalho, na identificação de problemas e no desenvolvimento de soluções.
Resposta dos(as) servidores(as) envolvidos(as)
Posso dizer que foi um grande amálgama de espanto, esperança, interesse e descrença. Enquanto alguns servidores mais novos se mostraram bastante esperançosos quanto às potencialidades do trabalho, outros com mais tempo de casa, e acostumados a ver ações desse tipo “morrerem na praia”, mostraram-se mais céticos às propostas. Mas, em geral, as pessoas que de alguma forma se envolveram ou foram consultadas estavam bastante interessadas e com boas expectativas em relação ao trabalho.
Etapas posteriores
O trabalho representa apenas um primeiro passo. A ideia por trás do tema trabalhado é que ele seja um estopim, ainda que distante, capaz de fomentar o debate em relação a algumas práticas que precisam ser repensadas, readequadas às novas exigências e necessidades tanto dos usuários do serviço jurisdicional, quanto dos servidores e juízes responsáveis pela prestação deste serviço. Pretendemos levar o trabalho ao Instituto de Inovação do TJPE para apresentação das propostas e discussão de ideias; depois, continuar nessa linha de pesquisa, desenvolvendo projetos e artigos que possam contribuir com a melhoria dos serviços públicos.