A cada Carnaval, a Prefeitura do Recife explora uma nova identidade visual para a festa que traz várias personagens e representações culturais. Esses elementos são o objeto de estudo da publicitária e designer Natasha Bezerra, que finalizou o mestrado em Design na CESAR School com a pesquisa “As mulheres negras no Carnaval Multicultural do Recife: um estudo semiótico das visualidades e visibilidades nos artefatos gráficos decorativos”, que analisa essas construções imagéticas e dá voz às mulheres retratadas.
O trabalho é um primeiro passo e Natasha espera continuar aprofundando o tema. “Desejo realizar algumas publicações e continuar estudando a construção imagética das mulheres negras brasileiras, no carnaval ou em outros objetos”. Confira:
Definição do objeto de estudo
A minha pesquisa foi toda construída dentro do mestrado mas uniu muitas questões pessoais, já que muito recentemente havia me descoberto como mulher negra e tive questionamentos sobre minha atuação profissional. O objeto foi definido a partir de conversas com minha orientadora. Eu já havia definido que seria sobre mulheres negras e imagens e Haidée trouxe a possibilidade de trazer isso no Carnaval.
Artefatos do Carnaval
Os artefatos uniam as minhas definições iniciais e também me suscitaram pensar mais intensamente as questões simbólicas da imagem da mulher negra no Carnaval. Além disso, o Carnaval é uma paixão e ele traz muito afeto para esse estudo, foi quando realmente comecei a brincar o Carnaval.
Mudanças ano a ano
Cada ano era um novo Carnaval, com um novo homenageado e isso já ditava algumas mudanças. Mas existem dois marcos bem importantes: em 2006, a decoração começa a ser baseada na obra do homenageado, passando a ser figurativa; e em 2012, no fim de uma gestão da cidade, há uma mudança no briefing e na designer responsável. O figurativismo traz uma complexidade a partir das releituras; e o novo briefing preza pela manutenção de mais características da obra original. Esteticamente isso gera mudanças mas do ponto de vista semântico/simbólico não há um direcionamento pré-estabelecido.
O retrato da mulher negra
As mulheres negras retratadas são reconhecíveis por características fenotípicas pronunciadas, como texturas capilar, cabelo black power, tons de pele (mais claras ou mais retintas) e elementos relacionados à religiosidades de Matriz Africana ou à cultura local (maracatu, frevo). Mas também há seminudez e nudez, sensualidade.
Foi a partir de 2001 que a decoração começou a ter destaque e o Carnaval em si ficou concentrado no Recife Antigo como polo principal. Em 2006, o figurativismo traz ainda mais forte essa possibilidade de aproximação do público. Esse período constrói uma identidade para o Carnaval e mesmo não observando apenas características positivas, ter essas mulheres negras representadas, num cenário no qual a população negra ainda era sub declarada por aversão aos estigmas sociais (que existem até hoje) é um ponto de evolução.
Resultados em destaque
Inicialmente, foi confirmada a presença de imagens de mulheres negras. Depois, mulheres negras que responderam questionário ou foram entrevistadas puderam expressar suas opiniões sobre algumas imagens. Então, especialmente, percebeu-se uma identificação com a religiosidade, com elementos culturais e rejeição à nudez, à sensualidade e à sexualização.
Penso essa pesquisa com um viés muito político e social, mas vejo que é preciso criar sensibilidade para representação de minorias. É incutir isso na prática profissional, não apenas como uma cobrança ou obrigação, mas como reparação histórica necessária, como contribuição e reflexo da sociedade. Quando as pessoas se enxergam, acreditam que é possível chegar lá.